segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Do conhecimento de Jesus Cristo dimana a compreensão de toda a Sagrada Escritura

 

A Sagrada Escritura não tem a sua origem na investigação humana, mas na revelação divina, que vem do Pai das luzes, de quem toda a paternidade toma o nome no Céu e na terra. Do Pai, por seu Filho Jesus Cristo, desce sobre nós o Espírito Santo; por meio do Espírito Santo, que reparte os seus dons e os distribui a cada um como Lhe agrada, se nos dá a fé; e pela fé Cristo habita nos nossos corações. Deste conhecimento de Jesus Cristo, como princípio original, depende a recta compreensão de toda a Sagrada Escritura. Por isso, não pode ter acesso ao conhecimento da Escritura quem não tiver antes infundida na alma a fé em Cristo, que é como a luz, a porta e o fundamento de toda a Escritura. Na verdade, enquanto vivemos ainda exilados longe do Senhor, a fé é o fundamento que nos sustém, a luz que nos guia, a porta que nos dá acesso a toda a iluminação sobrenatural; é pela fé que se mede o dom da sabedoria que recebemos de Deus, para que ninguém tenha de si mesmo uma opinião superior à que convém, mas sim uma opinião moderada, cada um segundo o grau da fé que Deus lhe atribuiu. A finalidade ou fruto da Sagrada Escritura não é um êxito qualquer: é a plenitude da felicidade eterna.

Porque as palavras da Escritura são palavras de vida eterna, pois foram escritas não só para acreditarmos, mas também para alcançarmos a vida eterna, aquela vida na qual veremos, amaremos e serão saciados todos os nossos desejos. Só então compreenderemos perfeitamente o amor de Cristo, que ultrapassa todo o conhecimento, e assim seremos enriquecidos com toda a plenitude de Deus. A esta plenitude há-de introduzir-nos a Escritura divina, segundo a afirmação do Apóstolo já citada. Esta é a finalidade, esta é a intenção que há-de guiar-nos ao estudar, ensinar e ouvir a Sagrada Escritura. Para chegar directamente a este resultado final, através do recto caminho da Escritura, devemos começar pelo princípio, isto é, voltar-nos para o Pai das luzes com fé sincera, dobrando os joelhos do nosso coração, para que Ele, por seu Filho, no Espírito Santo, nos dê o verdadeiro conhecimento de Jesus Cristo e, com o conhecimento, nos dê o seu amor. Deste modo, conhecendo-O e amando-O, fundados solidamente na fé e enraizados na caridade, podemos compreender a largura, o comprimento, a altura e a profundidade da Sagrada Escritura, e por este conhecimento podemos chegar ao conhecimento pleno e amor extático da Santíssima Trindade, para onde se voltam as aspirações dos santos e onde está a perfeição de toda a verdade e de toda a bondade.



Do «Brevilóquio» de São Boaventura, bispo (Prologus: Opera omnia 5, 201-202) (Sec.XIII)

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