sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Eva e Maria


O Senhor abraçou a condição humana e manifestou-Se no mundo que era seu; a natureza humana sustentava o Verbo de Deus, mas era o Verbo que sustentava a natureza humana. Cristo veio recapitular a desobediência cometida junto à árvore do paraíso terrestre, mediante a sua obediência na árvore da Cruz. As consequências da maldita sedução com que foi enganada Eva, a virgem destinada ao primeiro homem, foram anuladas por meio da mensagem bendita da verdade que o Anjo trouxe a Maria, também ela virgem desposada com um homem. 

E assim, enquanto Eva, seduzida pela mensagem de um anjo, desobedeceu à palavra divina e se afastou de Deus, Maria, ao contrário, guiada pela anunciação de outro anjo, obedeceu à palavra divina e mereceu trazer a Deus em seu seio. Aquela, portanto, deixou-se seduzir para não obedecer a Deus, e esta deixou-se persuadir a obedecer-Lhe. Deste modo, a Virgem Maria tornou-se advogada da virgem Eva. 

Recapitulando em Si mesmo todas as coisas, o Senhor declarou guerra contra o nosso inimigo e venceu aquele que ao princípio, por meio de Adão, havia feito de nós todos seus prisioneiros; e esmagou a sua cabeça, segundo estas palavras de Deus à serpente que se lêem no Génesis: Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela; esta esmagará a tua cabeça enquanto tu tentarás ferir o seu calcanhar. 

Com tais palavras, se proclama de antemão que Aquele que havia de nascer da Mulher Virgem, feito homem como Adão, esmagaria a cabeça da serpente. É deste descendente que fala o Apóstolo na Epístola aos Gálatas: Subsistiu a Lei até chegar o descendente para quem tinha sido feita a promessa. Exprime-se ainda com mais clareza o Apóstolo na mesma Epístola, ao dizer: Quando chegou a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho, nascido de mulher. O inimigo não teria sido derrotado com justiça, se o seu vencedor não tivesse sido um homem nascido de mulher, pois que desde o princípio ele se tinha oposto ao homem, dominando-o por meio da mulher. 

É por isso que o Senhor afirma ser o Filho do homem, recapitulando em Si aquele primeiro homem de que foi plasmada a primeira mulher e, por meio dela, a humanidade; deste modo, se o género humano tinha sido precipitado na morte por causa de um homem vencido, agora ascendemos à vida por um homem vencedor.


Do Tratado de Santo Ireneu, bispo, «Contra as heresias»
(Lib. 5, l9, 1; 20, 2; 21, 1: SC 153, 248-250. 260-264) (Sec. II)

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