Com as palavras que cantamos, professamos que somos o povo de Deus: Ele é o Senhor nosso Deus, que nos criou. Ele é o nosso Deus, nós somos o seu povo, ovelhas do seu rebanho. Os pastores humanos têm ovelhas que não foram criadas por eles; apascentam um rebanho que não foi feito por eles. Ao contrário, o Senhor nosso Deus, porque é Deus e Criador, criou por si mesmo as ovelhas que tem e apascenta. Não foi outro que criou as que Ele apascenta, nem é outro que apascenta as que Ele criou.
Se professamos neste cântico que somos suas ovelhas, seu povo, ovelhas do seu rebanho, ouçamos o que diz às suas ovelhas. Anteriormente falava aos pastores; agora fala às ovelhas. Naquelas palavras, nós escutávamos com temor e vós com tranquilidade. Como será nestas palavras de hoje? Inverter-se-á a situação, escutando nós com tranquilidade e vós com temor? Não, por certo. Em primeiro lugar, porque, embora sejamos pastores, o pastor não só escuta com temor o que é dito aos pastores, mas também o que é dito às ovelhas. Se escuta tranquilamente o que é dito às ovelhas, é porque não se preocupa com as ovelhas. Em segundo lugar, como já explicámos à vossa Caridade, há duas realidades a considerar em nós: somos cristãos e somos chefes. Pelo facto de sermos chefes, somos contados entre os pastores, se formos bons; pelo facto de sermos cristãos, somos ovelhas como vós. Portanto, quer fale o Senhor aos pastores quer fale às ovelhas, temos de ouvir sempre com temor para que não esmoreça a solicitude em nossos corações.
Ouçamos, portanto, irmãos, a razão pela qual o Senhor repreende as ovelhas más e o que promete às suas ovelhas. E vós, diz Ele, sois as minhas ovelhas. Em primeiro lugar, se consideramos, irmãos, como é grande a felicidade de ser o rebanho de Deus, experimentaremos certamente uma grande alegria, mesmo no meio das lágrimas e tribulações desta vida. Na verdade, d’Aquele mesmo de quem se diz: Pastor de Israel, diz-se também: Não dormirá nem adormecerá Aquele que guarda Israel. Portanto, Ele vela por nós quando velamos e vela por nós quando dormimos. Por isso, se o rebanho dos homens se sente seguro sob a vigilância de um pastor humano, quanto maior não há-de ser a nossa segurança, tendo a Deus por pastor? E não somente porque Ele nos apascenta, mas também porque foi Ele que nos criou.
A vós, que sois minhas ovelhas, isto diz o Senhor Deus: Eu mesmo julgarei entre ovelha e ovelha e entre carneiros e cabritos. Que fazem aqui os cabritos no rebanho de Deus? Nas mesmas pastagens, nas mesmas fontes, andam misturados os cabritos, destinados à esquerda, com as ovelhas, destinadas à direita; por enquanto, são tolerados, mas um dia serão separados. E nisto se exercita a paciência dos homens à semelhança da paciência de Deus. É Ele quem há de separar no último dia uns para a esquerda e outros para a direita.
Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo
(Serm. 47, 1.2.3.6, De ovibus: CCL 41, 572-573.575-576) (Sec. V)
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